(É tudo o que eu sinto) Paulo Leminsky
Inverno
É tudo o que sinto
Viver
É sucinto
(Pergunte ao Sapo)Paulo Leminsky
noite alta
lua baixa
pergunte ao sapo
o que ele coaxa
(A palmeira estremece)Paulo Leminsky
a palmeira estremece
palmas pra ela
que ela merece
Astronave Helena Kolody
Soberbo monumento da astronáutica
num pedestal de cifras.
Bezerro de ouro, cosmonave!
Milhares de famintos baixaram ao vale da morte,
para que pudesse subir.
Ballet
Helena Kolody
Nuvem humana,
gaivota lunar,
o astronauta flutua,
livre da gravidade como os ressuscitados.
Constelações iluminam seu bailado,
no tablado da noite universal.
Helena Kolody
Não é mais a nativa Jaci, mãe dos frutos,
nem Selene viajora das planuras siderais. Ele é, agora, um astro morto, um satélite explorado pelas naves espaciais.
Conto - Dalton Trevisan
"Amanhã faz um mês que a Senhora está longe de casa. Primeiros dias, para dizer a verdade, não senti falta, bom chegar tarde, esquecido na conversa de esquina. Não foi ausência por uma semana: o batom ainda no lenço, o prato na mesa por engano, a imagem de relance no espelho.
Com os dias, Senhora, o leite primeira vez coalhou. A notícia de sua perda veio aos poucos: a pilha de jornais ali no chão, ninguém os guardou debaixo da escada. Toda a casa era um corredor deserto, até o canário ficou mudo. Não dar parte de fraco, ah, Senhora, fui beber com os amigos. Uma hora da noite eles se iam. Ficava só, sem o perdão de sua presença, última luz na varanda, a todas as aflições do dia.
Sentia falta da pequena briga pelo sal no tomate — meu jeito de querer bem. Acaso é saudade, Senhora? Às suas violetas, na janela, não lhes poupei água e elas murcham. Não tenho botão na camisa. Calço a meia furada. Que fim levou o saca-rolha? Nenhum de nós sabe, sem a Senhora, conversar com os outros: bocas raivosas mastigando. Venha para casa, Senhora, por favor."
Dalton TrevisanCom os dias, Senhora, o leite primeira vez coalhou. A notícia de sua perda veio aos poucos: a pilha de jornais ali no chão, ninguém os guardou debaixo da escada. Toda a casa era um corredor deserto, até o canário ficou mudo. Não dar parte de fraco, ah, Senhora, fui beber com os amigos. Uma hora da noite eles se iam. Ficava só, sem o perdão de sua presença, última luz na varanda, a todas as aflições do dia.
Sentia falta da pequena briga pelo sal no tomate — meu jeito de querer bem. Acaso é saudade, Senhora? Às suas violetas, na janela, não lhes poupei água e elas murcham. Não tenho botão na camisa. Calço a meia furada. Que fim levou o saca-rolha? Nenhum de nós sabe, sem a Senhora, conversar com os outros: bocas raivosas mastigando. Venha para casa, Senhora, por favor."
no muro o caracol
se derrete nos rabiscos
da assinatura prateada
Dalton Trevisanse derrete nos rabiscos
da assinatura prateada
O que não me contam eu escuto atrás das portas.
Dalton Trevisan
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